O Rei, o Dragão e o Vulcão

- Conto -

A cidade dos dragões fica naquela colina bem próxima ao mar. Aliás, não é bem uma cidade; melhor seria chamá-la, a caverna dos dragões.

Conta-se que no passado bem remoto, havia sobre a colina um imenso vulcão que atormentava os súditos de um rei muito astuto. Todos os anos o vulcão entrava em erupção e lançava sua lava incandescente sobre as casas que formavam a cidadela no vale próximo à colina.

Os camponeses desabrigados e atormentados, formavam longas filas nas proximidades do palácio real, para pedirem proteção ao rei. Receoso que seus súditos abandonassem  suas terras, o rei convocou seus conselheiros e solicitou que apresentassem uma solução para o problema.

Várias foram as sugestões apresentadas, mas entre elas houve uma, que “saltou aos olhos do rei”. É que Elias, o velho sábio da corte, teve uma idéia realmente genial. O mestre sabia que entre os dragões que habitavam as cavernas, havia um terrível dragão negro, tão voraz que nos dias de muita fome, chegava a devorar árvores inteiras, com frutos e folhas. E essas árvores foram tantas, que os dejetos formados pela madeira queimada na fornalha de seu estômago, resultaram em enormes depósitos de carvão.

Lembrando-se das proezas do terrível dragão, o esperto Elias sugeriu ao rei, mandar fazer, poucos dias antes de iniciar-se a erupção anual do vulcão, um imenso bolo de aniversário; tão grande que pudesse circundar toda a cratera do vulcão.

A ideia do mestre se baseava no fato dele ter observado durante anos seguidos, que toda vez que se iniciava a erupção, o grande dragão deixava sua companheira bem distante e se aproximava sozinho, protegido por sua couraça de escamas pétreas, para recarregar nas labaredas do vulcão, seu mortífero lança-chamas.

Recortado em grandes fatias, o enorme bolo foi instalado em volta da cratera, de forma que ao entrar em erupção, o vulcão erguesse seu espigão de fogo bem no centro do bolo, dando a nítida impressão de enorme vela de aniversário.

Tendo observado na escura noite anterior, algumas fagulhas que antecediam a erupção, o bicho iniciou sua marcha colina acima, provocando tal reboliço no matagal, que logo foi percebido pelo velho sábio e sua gente.

Ao atingir a clareira no topo da colina, a grande besta deparou-se atônita com o “bolo de aniversário” atrativamente confeitado, tendo ao centro sua flamejante vela, tão longa que parecia tocar as nuvens. No mesmo instante, em estridente ritmo festivo, no intuito de levar o dragão a pensar que se tratava da comemoração do seu próprio aniversário, Elias ordenou aos seus músicos que tocassem e cantassem o conhecido “parabéns pra você”.

Não sabemos se o dragão foi influenciado pela tradição humana de soprar a vela, ou se pretendia evitar que o vulcão derretesse o bolo. Certo é que a fera recuou alguns passos até apoiar-se numa enorme rocha, de onde ensaiou ritmados movimentos musculares em seu avantajado peito, fazendo seus observadores perceberem seu intento. Ao inflar seus pulmões com tão espantoso volume de ar, ao aspirar, a vegetação próxima também era sugada, como se tratasse de imenso aspirador de pó.

O propósito do animal logo se confirmou com o trovoar do primeiro sopro. Atingida pela pavorosa rajada de ar, a “grande vela” se  curvou ao meio assumindo a forma de ferradura, e foi arrastada para o horizonte, até que sua base foi arrancada das entranhas da cratera e a grande chama foi arremessada ao espaço.

Não se sabe ao certo, mas dizem que os relâmpagos e trovões que até hoje ressoam no céu, são restos de fogo daquele vulcão que atormentava as pessoas. Outros afirmam que a grande chama em forma de ferradura voltou à terra e pousou no horizonte, onde de vez em quando ainda é vista e chamada de Arco-Iris.

Talvez por estar muito cansado e faminto, ou no intuito de repor o grande volume de ar expelido para apagar sua vela hipotética, ao invés de comer normalmente o bolo, o dragão aspirou de uma só vez o grande círculo açucarado. O imenso bolo alongou-se e fluiu para as entranhas da fera, como se tratasse de uma longa composição ferroviária, com locomotiva e muitos vagões entrando velozmente num túnel.

E foi assim que o rei, com sua bondade e inteligência, conseguiu extinguir o vulcão e salvar seu povo de um grande e repetitivo sofrimento. Sabemos que o vulcão é um fenômeno natural e que o homem nada pode contra a Natureza. Nesse caso porém, devemos considerar que tanto o vulcão quanto o homem e o dragão, são três diferentes manifestações da Natureza, que interagiram para corrigir o mal que prejudicava tantas pessoas.

O povo chamou o rei, o rei chamou o sábio, o sábio chamou o dragão e o dragão extinguiu o vulcão. Quando o intento é praticar o bem, o homem tudo pode, pois toda natureza estará no homem.

2 comentários:

  1. Utilizei este texto em aula com meus alunos e o resultado foi maravilhoso.Obrigada por contribuir com textos tão inspirados.
    Sônia Bruno

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  2. Mestre!!! Com permissão. "A asttúcia do rei".
    Sua preocupação,era ficar sem os serviços de seus súditos,essenciais
    para a sobrevivência do palácio.
    Como fica um "Rei" sem "Reinado"!!!???
    O que seria de um "Rei" sem "Súdito"!!!???
    "Rei" sem "Súdito" nada é!!!
    O interesse do Rei sobrepõe a benevolência.
    Discordo da bondade do Rei.
    Aos olhos do sábio,que a tudo vê,sua inteligência,evidenciou que a
    "União faz a força".E a paz voltou a reinar no palácio,antes,ameaçado.
    Prefiro a hipótese do "Arco-íris".
    A luz do trovão,amedronta,apavora,ameaça!!!
    A luz do arco-íris,irradia vida,graça,beleza!!!
    O colorido do arco-íris/O colorido do louro(psitacídeo)exuberância
    de matizes.

    Branca,26/02/2012
    Obrigada,Mestre !!!

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